“Você Chegou” por Clayton Zocarato

 

Naquela tarde, em que o céu parecia caber inteiro dentro dos olhos dele, Clayton a viu descer da mesma linha de ônibus que pegava todo dia — mas naquele dia, ela vinha diferente. Vinha como quem traz saudade do futuro, e não do passado.

— Oi — disse Cristina, com um sorriso que carregava um mundo de perguntas que ela não fazia.

Clayton tentou sorrir de volta, mas dentro dele a alma tropeçava. Quantas vezes ele imaginou esse encontro? Quantas vezes sonhou em dizê-la que ainda a amava, mesmo nunca tendo dito isso quando era tempo?

Eles caminharam juntos pela avenida. A mesma de sempre. Com as árvores altas, os mesmos bancos gastos, o mesmo vento de final de tarde.

Só que agora, sem o peso do “nós” que nunca se formou de fato.

— Você sabia que eu sempre passava por aqui só pra, sei lá… ver se te via? — ela perguntou, com a leveza de quem já superou, mas ainda sente.

Clayton engoliu em seco.

— Eu também. Mas fingia que era por acaso.

Cristina parou. Olhou para ele com olhos castanhos que, mesmo depois de tanto tempo, ainda tinham aquele brilho de quem acredita que tudo pode recomeçar.

— Por que a gente nunca aconteceu, Clayton?

Ele hesitou. Depois, como se abrisse uma janela esquecida da alma, respondeu:

— Eu tive medo. Medo de me mostrar de verdade. Preferi me esconder atrás de um orgulho bobo. Eu achava que precisava parecer forte, seguro. Mas no fundo… só não sabia como te amar do jeito que você merecia.

Ela sorriu com um carinho triste. O tipo de sorriso que só quem amou calada entende.

— Eu só queria fazer parte da tua vida… mesmo que fosse só um pedacinho.

Silêncio. Daqueles cheios de palavras não ditas, de anos que passaram, de tudo o que poderia ter sido.

— Você chegou — ele disse, quase num sussurro — e mesmo não ficando, ficou em tudo. Na minha memória, no cheiro da sua rua, até no jeito como o céu muda de cor no fim do dia.

Cristina respirou fundo. Pegou a mão dele, como quem segura algo frágil, como quem, diz adeus sem dizer.

— Às vezes, amar em silêncio é a forma mais profunda de amor, sabe? E por mais que tenha doído… eu fui feliz com o que tivemos, mesmo que tenha sido pouco.

Clayton baixou os olhos. Por dentro, uma criança soluçava. Por fora, um homem que só agora entendia o que era amar de verdade.

Ela soltou sua mão com delicadeza.

E então, como da primeira vez, Cristina foi embora. Sem pressa, sem drama, sem voltar o rosto. Dessa vez, ele não tentou impedir. Porque agora sabia: algumas pessoas chegam pra nunca mais sair — mesmo que não fiquem. E naquela avenida de sempre, com o sol já se escondendo, Clayton entendeu que amar também é deixar ir.

Há amores que não morrem. Apenas mudam de forma. Viram rua, janela, cheiro de vento, trilha sonora de uma lembrança. Cristina foi embora, mas deixou em Clayton a mais doce permanência: a certeza de que o amor vivido ou não, é sempre real quando é sincero. Eu sabia que ele estaria lá. Não porque alguém me contou. Não porque combinamos, mas porque tem coisas que o coração sabe antes da gente.   E naquela tar-de, eu vesti a saudade como quem veste coragem.

Quando vi Clayton parado perto da banca de jornal, com aquele jeito de quem está no mundo e, ao mesmo tempo, distante dele, o tempo todo voltou pra mim. A avenida, a nossa não-história, os olhares que nunca viraram palavras. E a dor mansa — essa que não queima, mas também não passa. Ele sorriu pequeno. E eu, que achava que estava em paz, percebi que a paz é um lugar onde a gente finge não sentir. E foi como abrir uma fresta num livro esquecido. A verdade é que eu esperava que ele dissesse: “Eu também.” E ele disse!

Mas o que me doeu mesmo foi quando perguntei por que a gente nunca deu certo? Não era só curiosidade — era um pedido de desculpas que ele nunca soube que eu precisava ouvir.

 — “Tive medo.”!

Ele disse com os olhos no chão, e eu senti vontade de abraçá-lo. Mas não abracei. Porque às vezes o gesto atrasa a compreensão. E eu queria que ele entendesse. Queria que doesse nele um pouquinho como doeu em mim por tantos anos. Fiquei com ele por alguns minutos. Foi como viver todo o amor que não vivemos — num curto-circuito de eternidade. Porque certas conversas nos fazem passar por todos os estágios de um relacionamento em dez minutos: começo, meio, fim... e memória. Peguei sua mão. Ainda era dele, mas não era mais minha.

“Às vezes, amar em silêncio é a forma mais profunda de amor.”

Disse isso sem saber se dizia pra ele, ou pra mim mesma. Talvez para ambos. Talvez para aquela versão de mim que um dia teve esperança. Depois fui embora. Mas dessa vez ele entendeu. E isso bastava.

Eu? Eu sigo lembrando dele às vezes. Não com tristeza, nem com arrependimento. Mas com aquele tipo de ternura que só o amor não vivido carrega. Eu fui embora. Mas nunca parti. Porque, no fundo, ele sempre foi meu lar. Mesmo que eu só tenha morado nele por dentro.

Clayton, para si mesmo:

— Cristina, você chegou. E mesmo sem ficar, ainda está aqui. Aquele dia, quando te vi descendo do ônibus, o mundo parou — mas eu não soube o que fazer com isso.

A verdade é que te esperei por anos. Em silêncio, por covardia. Por orgulho.

Você sempre foi tudo o que eu quis, mas eu era tão preso à imagem de homem invulnerável, de quem não sente, que acabei me tornando alguém que só sabia olhar — nunca agir.

A avenida continua igual.

O banco onde eu fingia esperar alguém que não era você ainda está lá. Mas só agora percebo: eu esperava você o tempo todo.

Queria ter te amado com liberdade.

Queria ter dito “fica”.

Mas você foi embora. E eu fiquei aqui.

Preso no amor que não soube viver.

Eu cheguei, sim. Mas não estava pronto.

E você não saberia esperar tanto.

Porque a gente espera o que se mostra possível — e você nunca me deixou saber se era.

Sempre me perguntei se o silêncio era recíproco, ou, se eu era só mais uma lembrança embaçada no fundo da sua rotina. Mas quando te encontrei de novo, anos depois, entendi: você me amou.

Só não soube como.

Eu segui. Mas carreguei você nas esquinas da alma.

Em cada amor que veio depois, eu procurava o que nunca fui em você.

Aquela nossa conversa na rua, tão breve… me deu a resposta que eu sempre quis, e a dor que eu sempre evitei.

Sim, você me amou.

E sim, era tarde.

Mas, de algum jeito estranho, foi bonito mesmo assim.

Clayton refletindo...

— Eu ainda penso na sua voz dizendo: “Às vezes, amar em silêncio é a forma mais profunda de amor.” E entendi. Você não foi embora com raiva. Nem com tristeza. Você foi embora com paz. E isso doeu mais do que se você tivesse me odiado.

Agora, te guardo como se guarda uma canção antiga. Uma daquelas que a gente não ouve mais, mas que, quando toca por acaso, faz o mundo inteiro desacelerar. Você chegou. E aqui dentro... você permanece, Cristina, pela última vez. Eu fui embora, sim. Mas não parti. Você sempre será meu quase, meu silêncio preferido, minha primavera adiada. Talvez em outra vida. Talvez em outro tempo, onde o orgulho seja só uma lembrança boba. Até lá…

Cuide bem da parte de mim que ficou aí com você.

SOBRE O AUTOR

Clayton Alexandre Zocarato


Possui graduação em Licenciatura em História pelo Centro Universitário Central Paulista (2005) - Unicep - São
Carlos - SP, graduação em Filosofia pelo Centro Universitário Claretiano (2016) - Ceuclar - Campus de São José do Rio Preto – SP.. Escrevo regularmente para o site www.recantodasletras.com.br usando o pseudônimo ZACCAZ, mesclando poesia surrealista, com haikais e aldravias.. Onheça mais do autor!

·                  Email: claytonalexandrezocarato@yahoo.com.br

·                  Instagram: Clayton.Zocarato


Clayton Alexandre Zocarato faz parte do programa "Escritores de Sucesso" faça parte também deste programa do Jornal e Editora Alecrim.

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