Promessas ao Fim do Século (Conto baseado na canção I Will dos Bee Gees – 1997) - Por Clayton Zocarato
Nos anos 1990, a
cidade respirava em passos lentos.
O concreto das ruas parecia guardar
a memória de gerações, e as praças antigas ainda mantinham o cheiro da
infância, das risadas que ecoavam entre árvores e bancos de madeira.
Era uma década de transição: discmans
competiam com rádios de pilha, fitas cassete eram tesouros e cartas manuscritas
tinham o peso da eternidade.
Leonardo caminhava por essas ruas
com uma mistura de melancolia e esperança. Seus
passos se misturavam aos sons da cidade: vendedores ambulantes anunciando
frutas, o ranger das bicicletas antigas, o tilintar de moedas na calçada.
Mas havia algo mais profundo que
ressoava em seu coração: a lembrança de Clara, amiga de infância que
desaparecera há anos e que agora parecia retornar dos ecos de um sonho antigo.
O reencontro aconteceu por acaso, ou
talvez por destino. Leonardo entrou numa livraria antiga, procurando por um
romance que ele nunca compraria, apenas folhearia.
Entre estantes de madeira gastas, viu Clara
inclinada sobre partituras de piano. O
tempo parecia suspenso. O mundo fora de lá desapareceu.
- “Leonardo?”, disse ela, com a voz
suave, carregada de uma surpresa contida.
- “Clara…”, respondeu ele, sentindo
uma mistura de alegria e nostalgia atravessar-lhe o peito. “Não esperava te
encontrar aqui.”
Ela sorriu.
- “Eu também não. Mas parece que o
tempo resolveu nos dar outra chance.”
Aquele encontro desencadeou uma
sequência de momentos que pareciam extraídos de uma música que ambos amavam.
Eles caminharam pelas ruas da
cidade, conversando sobre livros, filmes e canções da década: Bee Gees, Oasis,
Alanis Morissette.
Cada melodia se transformava em
memória, cada riso se tornava promessa.
Em um café com mesas de madeira,
cheiro de pão fresco e jazz suave tocando ao fundo, eles se sentaram frente a
frente.
Leonardo notou que Clara havia
mudado de maneiras sutis: o cabelo agora mais longo, os olhos mais profundos,
carregando uma maturidade serena.
Mas sua essência continuava intacta,
e por isso, a nostalgia parecia doce.
- “Você lembra daquelas tardes de verão,
quando ficávamos ouvindo música no seu
quarto, só imaginando o futuro?” perguntou Clara.
- “Lembro. E lembro também da
promessa que fizemos de nunca nos perder”, respondeu Leonardo.
Clara riu, mas seus olhos ficaram
sérios. “A vida nos perdeu um pouco, mas
acho que nos reencontramos agora. Talvez
seja tempo de cumprir nossas promessas, mesmo que tardias.”
A cada dia, eles redescobriam-se.
Passeios ao entardecer pela praça, visitas à livraria, piqueniques no parque.
Cada instante carregava a leveza dos
pequenos gestos e a intensidade dos sentimentos que não haviam envelhecido.
Leonardo escrevia cartas que deixava
discretamente no bolso de Clara, ou em livros que ela comprava, como cápsulas
de tempo.
Cada carta era uma promessa
silenciosa: “Estarei contigo, mesmo
quando os dias forem longos e solitários.”
Certa noite, sentados à beira do
rio, Leonardo olhou para Clara e disse:
-
“Se pudesse, faria uma promessa que atravessasse o tempo. Diria que estarei contigo, não importa a
distância, não importa a escuridão, não importa o que vier.”
Clara segurou sua mão, olhando-o nos
olhos.
-“Não
precisamos de palavras gravadas em fitas ou CDs, Leonardo. Nós já sabemos.
Estaremos.”
O verão de 1997 era intenso, e a
cidade parecia vibrar com uma melodia invisível, como se cada nota de suas
músicas favoritas ecoasse pelo ar, traduzindo o que eles sentiam.
À noite, eles se encontravam em
cafés ou parques silenciosos, observando as luzes da cidade refletirem nas
águas do rio.
Cada detalhe se tornava memória,
cada momento se transformava em eternidade.
Em cartas escritas à mão, Leonardo
expressava sua devoção:
"Clara, hoje ouvi a nossa música antiga na rádio e pensei em você. Cada
acorde me lembra a promessa que fizemos. Mesmo que o mundo mude, mesmo que
sejamos levados por caminhos diferentes, minha presença estará contigo. Não como espectro, mas como alguém que
escolheu permanecer, sempre."
Clara respondia com bilhetes tão
simples quanto profundos:
"Leonardo,
cada dia que passamos juntos ou separados, sinto que nossa promessa cresce. Não
precisamos de discursos grandiosos. Basta o cuidado, o olhar atento, a certeza de
que, mesmo na ausência, somos companhia um do outro."
Eles também enfrentaram desafios:
viagens de trabalho, compromissos familiares, pequenas ausências que testavam a
força do vínculo. Mas, ao invés de enfraquecer, essas ausências fortaleciam sua
ligação.
A saudade se transformava em
lembrança e em promessa, reafirmando o poder de uma devoção silenciosa e
constante.
Uma tarde, ao ouvirem uma música dos
Bee Gees I Will, Leonardo disse:
- “É curioso como a música nos conecta. Parece
que as melodias sabem o que não conseguimos dizer em palavras.”
- “Ela nos lembra que algumas
promessas não precisam de testemunhas”, respondeu Clara.
E assim, entre cartas, passeios,
cafés e músicas, eles construíram um amor que era ao mesmo tempo íntimo e
filosófico. Um amor que compreendia que estar com alguém não é possuir, mas
escolher permanecer, diariamente, com atenção e cuidado.
Com o fim da década se aproximando,
o mundo acelerava: a internet começava a se tornar onipresente, celulares
ganhavam popularidade, e a sensação de urgência crescia. Mas para Leonardo e
Clara, nada disso importava.
Eles aprenderam que o tempo é
relativo quando medido pelo afeto verdadeiro. O amor deles era uma melodia
invisível, eterna, que atravessava anos e promessas, capaz de resistir à
velocidade do mundo.
No último verão do século XX,
sentados à beira do rio iluminado pela lua, Clara falou:
- “Leonardo, lembra quando dizíamos
que nunca deixaríamos ninguém nos perder?”
- “Lembro. Mas aprendi que o que
importa não é apenas a promessa em palavras, mas a promessa em presença”,
respondeu ele. “Mesmo que tudo mude, estaremos aqui.”
E eles permaneceram, assim como
naqueles anos 1990: atentos, constantes, apaixonados.
Sem pressa, sem necessidade de
grandiosidade, apenas vivendo o cotidiano com a intensidade de quem sabe que
algumas promessas atravessam décadas e ainda ecoam, como uma melodia que nunca
se apaga.
No final, enquanto a década chegava
ao fim, Leonardo e Clara olharam para o céu noturno, ouvindo uma canção antiga
na rádio.
O som parecia envolver a cidade inteira,
lembrando-lhes que o amor verdadeiro é menos sobre gestos épicos e mais sobre
presença, constância e o ato silencioso de escolher um ao outro, repetidamente,
sem testemunhas, sem aplausos, apenas vivendo cada momento como se fosse
eterno.
E assim, nos anos 1990, entre
cartas, discmans, cafés e risos, eles descobriram que o amor é menos sobre possuir e mais sobre
permanecer — sobre manter a melodia viva, mesmo quando o mundo insiste em
acelerar demais.
Porque algumas promessas, feitas com
devoção e cuidado, atravessam o tempo.
E Leonardo e Clara aprenderam que,
no fim do século, a eternidade estava contida nos pequenos gestos: nos olhares,
nas cartas, nas músicas e na certeza silenciosa de que o amor verdadeiro
escolhe permanecer.
Naquele instante, o rio, as árvores,
a cidade inteira pareceram testemunhar a intensidade de sua devoção.
Não era um amor feito de grandes
gestos, mas de constância e presença incondicional.
Eles sabiam que a vida poderia
separá-los, que o mundo mudaria e que, talvez, houvesse dor e saudade. Mas
nenhuma distância poderia quebrar o elo que haviam construído — um elo que,
como na canção dos Bee Gees, prometia: “eu
estarei, venha o que vier”.
O verão se transformou em outono, e
cada pôr do sol se tornou uma celebração silenciosa de sua escolha de estar
juntos, apesar das mudanças do mundo.
Cada abraço era uma reafirmação da
promessa; cada carta, uma reafirmação do compromisso.
Eles aprenderam que o amor
verdadeiro não é apenas sentir, mas escolher permanecer, repetidamente, mesmo
quando não há testemunhas ou aplausos.
Nos últimos dias do século, enquanto
a cidade se preparava para o novo milênio, Leonardo
e Clara caminharam pelo parque onde tudo começara.
O céu estava tingido de tons
laranjas e roxos, e uma brisa leve trazia o som distante de uma rádio que
tocava canções antigas.
- “Sabemos
que o mundo vai mudar amanhã”, disse Clara. “Mas o que importa é que estamos
aqui hoje, juntos. E sei que estarei
contigo, e você comigo, não importa o que venha.”
Leonardo sorriu, sentindo a verdade
dessa promessa ecoar como a melodia de sua canção favorita. “Sempre, Clara. Para hoje, para amanhã, para sempre. Eu
estarei.”
Eles se abraçaram, e naquela noite,
sob as luzes da cidade e o céu estrelado, compreenderam que o amor absoluto,
feito de presença, cuidado e devoção silenciosa, era a única promessa capaz de
atravessar o tempo.
Enquanto caminhavam de mãos dadas,
sentiam a canção pulsando em cada passo, em cada gesto: a música que os
lembrava de que, não importa o que aconteça, alguns laços são eternos, tocava
sem parar em corações.
A promessa dos anos 1990, inspirada pela
melodia e pela letra de “I Will”, transformava-se
em realidade viva, gravada não em fita ou disco, mas no coração de cada um.
E assim, Leonardo e Clara seguiram
juntos, escolhendo permanecer todos os dias, provando que o amor verdadeiro não
é feito apenas de palavras ou gestos grandiosos, mas da eterna e silenciosa
decisão de estar lá, incondicionalmente, para quem se ama.
No final, o mundo mudaria, a cidade
se modernizaria, novas músicas surgiriam, mas a essência daquela promessa
permaneceria, eterna, como a melodia que os uniu nos anos 1990 e que agora
continuaria a ecoar em cada decisão de cuidar, amar e permanecer.
Enquanto caminhavam de mãos dadas,
Leonardo e Clara sentiam que cada passo reverberava como as notas de uma música
eterna.
Não era apenas o som das rádios
antigas ou o eco distante de uma vitrola, mas algo que existia dentro deles: a
certeza de que, independentemente das circunstâncias, estariam juntos.
Era como se a canção que os
inspirara, aquela promessa silenciosa de devoção absoluta, tivesse se
transformado em um código secreto, compreendido apenas pelos corações que amam
de verdade.
Na praça onde haviam se conhecido
tantos anos antes, eles pararam.
As folhas caídas do outono
rodopiavam ao vento, lembrando-lhes que o tempo não espera por ninguém, mas
que, ainda assim, algumas coisas permanecem.
Leonardo olhou para Clara, vendo não
apenas a mulher que reencontrara, mas a amiga de infância, a confidente, a alma
que o conhecia melhor do que ele mesmo.
- “Lembra da primeira vez que
ouvimos essa música juntos?”, perguntou ele, apontando para a melodia distante
que escapava de uma das lojas antigas.
Clara sorriu, fechando os olhos por
um instante.
-“Lembro. E lembro da promessa que
fizemos, mesmo sem palavras: estar sempre lá um para o outro.”
Leonardo sentiu que a vida, com
todas as suas voltas e incertezas, finalmente os havia conduzido a esse ponto
de paz.
Ele percebeu que o amor verdadeiro
não exige perfeição, apenas constância. Não exige espetáculo, apenas presença.
E foi nesse entendimento que ele se
sentiu completo, como se todas as promessas de outrora finalmente encontrassem
sua forma plena.
Eles permaneceram ali, sentados na
beira da fonte da praça, observando o reflexo da lua na água.
As luzes da cidade piscavam
suavemente, e a música continuava a tocar, lembrando-os de que algumas melodias
nunca se vão, assim como algumas promessas não podem ser quebradas.
Leonardo apertou a mão de Clara, e ela,
sentindo a firmeza do gesto, sorriu novamente.
-
“Não importa o que o futuro traga”, disse ele, “nem as mudanças que o mundo nos
imponha. Eu estarei contigo, assim como
na música que ouvimos tantas vezes. Se algum dia a vida nos afastar, meu
coração saberá o caminho de volta.”
Clara encostou a cabeça em seu
ombro, sentindo a profundidade da declaração. -
“E eu estarei contigo. Não porque seja obrigação, mas porque é impossível não
querer estar. É assim que o amor verdadeiro funciona. Ele simplesmente existe, e nós existimos com
ele.”
O vento da noite trouxe consigo o
cheiro distante de livros antigos e cafés ainda abertos, misturando passado e
presente, realidade e lembrança.
Era uma sensação de eternidade
concentrada em um único instante, e ambos sabiam que aquele momento encapsulava
o espírito de todos os anos que os haviam separado e aproximado novamente.
No silêncio que se seguiu, apenas o
som da água e a melodia distante da música preenchiam o espaço.
Leonardo percebeu que, assim como na
canção dos Bee Gees, não importava o que viesse — ele iria, estaria presente,
amaria e cuidaria.
E Clara, sentindo a mesma certeza, sabia que o
compromisso deles não precisava ser repetido em palavras ou promessas formais.
Ele já existia em cada gesto, em
cada olhar, em cada respiração compartilhada.
Enquanto a lua iluminava a praça,
eles permaneceram juntos, conscientes de que a vida continuaria mudando, mas
que o amor que haviam cultivado nos anos 1990 permaneceria firme, inabalável,
como uma melodia que nunca se apaga.
E naquele instante, sob o céu do fim
do século, ambos compreenderam plenamente: algumas promessas não se fazem
apenas em músicas, nem em palavras — elas se fazem em presença, cuidado e a
eterna decisão de permanecer, sempre, ao lado de quem se ama.
Possui graduação em Licenciatura em História pelo Centro Universitário Central Paulista (2005) - Unicep - São Carlos - SP, graduação em Filosofia pelo Centro Universitário Claretiano (2016) - Ceuclar - Campus de São José do Rio Preto – SP, Técnico em Comércio Exterior pelas Faculdades Eficaz, e atualmente cursa Serviços Jurídicos e Notoriais na Unimar. Escrevo regularmente para o site www.recantodasletras.com.br usando o pseudônimo ZACCAZ, mesclando poesia surrealista, com haikais e aldravias..Formado Especialista em Medina y Arte com ênfase em Gilles Deleuze e Equizoanálise onde é também pesquisador do Centro de Medicina y Arte de Rosário – Argentina, sendo o primeiro brasileiro a atuas nesse centro de pesquisa. Especialista em Ensino pela Ufscar, especialista em Psicopedagogia Institucional pela Fundepe – Unesp, Especialista em História da África pela Faculdade de Minas Gerais.
· Email: claytonalexandrezocarato@yahoo.com.br
· Instagram: Clayton.Zocarato
· Facebook: https://www.facebook.com/clayton.zocarato/
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